quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Novas teses de direito penal e casos notórios no balanço da Terceira Seção

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), responsável pela apreciação de questões envolvendo matéria penal, juntamente com as duas Turmas que a compõem, teve quase 50% a mais de processos julgados do que os que foram distribuídos a seus ministros neste ano. Entre os mais de 74 mil julgamentos em 2012, foram definidos temas críticos nessa matéria.

Crimes sexuais

Entre os julgamentos em destaque está o que manteve a jurisprudência de que tem presunção absoluta de violência o estupro de menor de 14 anos, conforme vigente antes da mudança do Código Penal que instituiu o conceito de estupro de vulnerável. Com a decisão, retomou-se o entendimento de que o crime não pode ser descaracterizado caso o réu comprove que a vítima tinha condições de consentir com o ato sexual.

A Seção também consolidou, em recurso repetitivo, que o estupro é crime hediondo independentemente de causar lesão ou morte da vítima. Para os ministros, a hediondez do crime decorre da própria violação da liberdade sexual da vítima, que é o bem jurídico tutelado pelo tipo penal. Assim, a violação da integridade física é irrelevante para dar esse caráter ao crime.

Maria da Penha

Em 2012, o Tribunal também reforçou a aplicação da Lei Maria da Penha. Os ministros afastaram a necessidade de coabitação para incidência da lei. Assim, basta que se configure a relação íntima de afeto entre agressores e vítimas para atrair o rigor maior da lei.

Os magistrados entenderam ainda que a lei se aplica não só a relações entre companheiros, mas entre irmãos e mesmo cunhados (HC 172.634). Em outras palavras, qualquer relação familiar, afetiva ou doméstica atrai a incidência da lei.

Decisão da Quinta Turma (RHC 27.622), um dos colegiados criminais ligados à Terceira Seção, é um exemplo disso. Segundo ela, não se pode afirmar que a pena mais grave atribuída ao delito de lesões corporais praticado no âmbito das relações domésticas seja aplicável apenas nos casos em que a vítima é mulher, pelo simples fato de essa alteração ter-se dado pela Lei 11.340/06, mais conhecida como Lei Maria da Penha.

Os ministros consideraram que, embora essa lei tenha sido editada com o objetivo de coibir com mais rigor a violência contra a mulher no âmbito doméstico, o acréscimo de pena introduzido no Código Penal pode perfeitamente ser aplicado em casos nos quais a vítima de agressão seja homem. Nesse caso apreciado pela Turma, a vítima era um pai agredido pelo filho.

A Sexta Turma, o outro colegiado integrante da Terceira Seção, está em uníssono com esse entendimento. Os ministros concluíram, no julgamento de um habeas corpus (HC 184.990), que deve ser aplicada a lei no caso de ameaça (prevista no artigo 147 do Código Penal) feita contra mulher por irmão, ainda que não residam mais junto. Isso porque, para a configuração do crime de violência contra a mulher, não há a exigência de coabitação à época do crime, mas somente a caracterização de relação íntima de afeto.

Lei Seca

Outra decisão relevante foi a da prova de alcoolemia ao volante (REsp 1.111.566). Em março, por diferença de um voto, a Seção definiu, em recurso repetitivo, que somente o bafômetro ou o exame de sangue serviriam para comprovar o grau de embriaguez que a lei exigia para dar início à ação penal.

Na ocasião, diversos ministros criticaram a redação da chamada Lei Seca. A decisão levou o tema a debate de toda a sociedade e motivou o Congresso Nacional a alterar a lei, permitindo outros meios de prova.

Não mais

Em 2012, os ministros passaram a adotar o entendimento de que o habeas corpus substitutivo de recurso ordinário em habeas corpus não deve ser apreciado pelo STJ. Os ministros consideram que o instituto passou a servir como meio de impugnação ordinária a qualquer matéria criminal. Algumas vezes, nem remotamente vinculada ao direito de locomoção.

Para os magistrados, o desvirtuamento do sistema jurídico com a busca da via excepcional do habeas corpus, em vez das vias ordinárias, compromete a funcionalidade dos recursos, impedindo que temas realmente necessários de serem tratados pelo remédio constitucional sejam apreciados em tempo hábil.

A César o que é de César

Competência foi um tema presente em muitos casos de destaque julgados na Seção. Em um deles (CC 122.596), os ministros determinaram que cabe à Justiça Federal julgar os casos sobre assalto em agências da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, mesmo que estas sejam comunitárias. Só atrairia a competência da Justiça estadual se a agência fosse explorada por particular, mediante contrato de franquia. Isso porque, entenderam os ministros, a Portaria 384/01 do Ministério das Comunicações, que regula esses estabelecimentos, aproxima as agências comunitárias muito mais da exploração direta pelos Correios do que dos contratos de franquia.

A portaria define a agência comunitária como unidade de atendimento terceirizada operada mediante convênio por pessoa jurídica de direito público ou privado, “desde que caracterizado o interesse recíproco”. Diferentemente do contrato, em que os interesses das partes são opostos, no convênio eles são recíprocos, o que levou o relator a observar que a atividade postal realizada nas agências comunitárias “ostenta interesse por parte da empresa pública federal”.

Ainda sobre competência, a Seção (REsp 1.166.251; REsp 1.176.264) entendeu que a autoridade presidiária não tem poder para conceder saída temporária a detento. Para os ministros, não cabe ao administrador do presídio autorizar as saídas de maneira automática, a partir de uma única decisão do juízo das execuções penais. Cada saída deve ser concedida e motivada pelo magistrado, com demonstração da conveniência da medida, sujeita à fiscalização do Ministério Público.

A renovação automática, fiscalizada pelo administrador do presídio, contraria a lei, não bastando o argumento de desburocratização e racionalização do juízo da Vara de Execuções Criminais como justificativa plausível para a não observação da Lei de Execução Penal. A decisão foi majoritária. Continuar lendo

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